segunda-feira, 24 de junho de 2013

Uma visita à psique

Aproxime-se, cavalheiro, 
Ou dama, seja o que for. 
Adentre os portões de minha cidade 
Entenda que não possuo maldade, 
Se lhe pareço sorrateiro 
É porque não conheces ainda minha dor. 

Venha, senhorita ou nobre cavalheiro, 
Não tropece nas minhas incertezas, 
Tome cuidado com os poços rasos, 
Eles podem parecer vagos 
Mas o mínimo devaneio 
E estarás em suas profundezas. 

Acompanhe-me, mademoiselle ou monsieur, 
Atravesse este portal 
E estarás dentro de meu singelo lar, 
O único que existe neste lugar, 
Onde posso soturnamente viver 
Na tal confusão astral. 

Conte-me, respeitável ser, 
Que sentes ao me ver? 
Quem sabe pena, ou medo, talvez? 
Ou vontade de ver-me outra vez? 
Ora, pois sinto-lhe dizer, 
Já é chegada a hora de desaparecer. 

Pois bem, honorário ou honrosa, 
Vos digo, 
Para não correres perigo 
Leva contigo esta rosa, 
Única por entre essa escuridão, 
Leva-a junto a teu coração 
Para que tenhas algo meu contigo, 
Dou-te um beijo de adeus então, 
Que nos encontremos outro dia, fora do chão.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

As ruas da poesia

Folhas caem, e o que mais poderia eu dizer?
Folhas caem, e eu não sou capaz de impedir o tempo de escorrer.
As areias luminosas esvoaçam pelo vento,
E em nuvens de poeira me pegam desatento,
E ao olhar para trás...
Somente um vazio.
Somente aquilo que sobra após o caos,
Escombros de um mundo pueril.
Ora, mas que dimensão maravilhosa toma a vida!
Que curva majestosa a que ela contorna decidida!
E quem sabe, em cada esquina dessa vasta imensidão que temos por mundo
Possa encontrar aqueles jardins que outrora cultivei nos meus mais belos sonhos
E entre cores e flores voava meu pensamento, soturno
Nadando nas águas claras de um rio de pureza,
E que fique claro que tenho a mais tenra certeza
Que um mapa hei de traçar
E cada canto desse mundo de poesia desvendar
E serei então viajante eterno da essência de meu existir,
Afinal, o perfume daquelas rosas em mim ainda pode resistir.

Fora do túmulo

Havia há muito sido colocado a sete palmos abaixo daquele chão, onde nem os vermes quiseram tocá-lo, talvez por ojeriza, ou talvez por qualquer outro produto em que o defunto tivesse sido imerso. Mas ali estava, alguns dedos corroídos, com os ossos de fora, tateando o chão do jardim, transformado em cemitério pela única pessoa que compareceu a seu sepulcro, o Padre, e puxando com todas as forças possíveis para poder se livrar daquela quantidade de terra que o cobria. Cambaleava sobre as pernas pálidas que apareciam entre os rasgões da calça velha que vestia, seus braços caídos jogavam seu peso para a frente de seu corpo, o que fazia com que tropeçasse por várias vezes durante o caminho. Chegando aos três degraus da pequena escada que antecedia a entrada da grande casa gótica de madeira e de uma atmosfera pesada e inexplicavelmente fascinante, seu pé batia sobre o chão o fazendo cair sobre o assoalho. Foi arrastando-se até a entrada, onde a porta pendia por uma só dobradiça, a empurrou com sua força que ainda restava, derrubando o que sobrou daquela porta para dentro, causando um terrível barulho digno dos mais terríveis pesadelos. Ia, arrastando-se através do chão, cheio de buracos e poeira, até que suas forças cessaram e por ali ficou, como se finalmente tivesse morrido, como havia acontecido antes. Naquele mesmo local. Naquela mesma casa. Daquele mesmo jeito. Mas que persistência possui o sentimento! Que bela força surgiu, para que naquele momento tomasse impulso suficiente capaz de erguê-lo totalmente do chão e fazer com que andasse, mesmo que lentamente, em direção ao velho piano, coberto por teias de aranhas e decorado por buracos que os insetos foram capazes de fazer naquele período de tempo. Sentou-se no banco, que rangeu como se estivesse espantado com sua presença de volta àquele local. Seus dedos cadavéricos e sem pele percorriam as teclas do piano, tocando a mais horrenda melodia, como uma marcha que encobria o velório de algo, ou alguém, de muita importância no mundo material, talvez do próprio, ou talvez daquele que há muito havia sido enterrado nas mais profundas terras das regiões mais inexploráveis. O amor. Sim, aquele estava, como o próprio projeto de morto-vivo, ali colocado, apertando as notas enquanto a poeira subia e as teias se desgrudavam dos cantos do piano, enterrado e jogado aos vermes. Mas como esses dois personagens formam-se em um só, ali estava o amor, feito em pedaços, mas vivo, tocando suas notas macabras naquela casa vazia e de aspecto tenebroso. Por quanto tempo ainda há de resistir? Por quantos séculos suas notas soarão nos corações dos que sabem ouvir? Até quando sua vitalidade duraria? Isso ninguém poderia me responder.

sábado, 8 de junho de 2013

Uma flor em meio ao fogo


Diz-me se há saída,
Se no fim dessa dolorosa tormenta
Há algo que se chame de "vida",
Se no escuro do inferno
Uma luz acalenta
E nos chama, sedenta
Clamando por algo que em meio ao caos
Não tem-se conhecimento atento

Nos tempos de insano desalento
Possa chamar-se de paz


Que me resta, senão torcer-me compulsivamente
A fim de escapar desta fera

Que aos poucos devora as faculdades de minha mente
E em instantes toma-me por completo
A ponto de nem mesmo uma imagem refletida
Ser retrato fiel desta alma contida
E perseguida por tamanha escuridão


Onde estaria o brilho incomum das estrelas infinitas
Que outrora via-se em aura, incontidas
A encandear a morbidez da vida
Fugindo nas asas da noite descrita
Para onde jamais chegaria nossa vista

Onde encontrar o sentido dessa explosão
Ou somente algo que conforte o coração
Quem sabe pelo menos o que se conhece por "paixão"
Para que ileso possa escapar dessa confusão?

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Dama de meus dias

Que seria da vida sem monotonia?
Que seria, sem o cinza, de meus dias?
Um vazio que gera vazio
Um mais vazio que gera devaneio.
Guardo nas gavetas de minha mente,
No mais profundo sono, debilmente,
Aquelas fotografias frias,
Retratando a superada melancolia,
Melancolia dos distantes dias
Em que sem perceber, no mínimo som
Dançava nos salões da poesia
Um coração que das trevas fugia
(Mas ora, como fugir da sombra
Se do sol você se esconde?)
Agora procuro-te
Apesar de não saber por onde
Agora imploro-te por aquelas asas,
Pois encontro-me embriagado
Vagando pelas ruas da realidade,
Como que deixado de lado por crueldade
(Talvez uma crueldade de mim mesmo,
Afinal, joguei minhas asas a esmo)
E então, onde anda, deusa primordial
Imortal, celestial, angelical,
Me leve a um passeio mental,
Ou a um simples estado sentimental
Onde pudesse encontrar-te e pedir-te perdão,
Bela dama, inspiração.


-Marcos